quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Jesus era...


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(foto fonte: legacycreative.gettyimages.com)

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Jesus era... Peripatético (por Max Gehringer)

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Numa das empresas em que trabalhei, eu fazia parte de um grupo de treinadores voluntários.
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Éramos coordenados pelo chefe de treinamento, o professor Lima, e tínhamos até um lema: "Para poder ensinar, antes é preciso aprender" (copiado, se bem me recordo, de uma literatura do Senai).
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Um dia, nos reunimos para discutir a melhor forma de ministrar um curso para cerca de 200 funcionários.
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Estava claro que o método convencional - botar todo mundo numa sala - não iria funcionar, já que o professor insistia na necessidade da interação, impraticável com um público daquele tamanho.
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Como sempre acontece nessas reuniões, a imaginação voou longe do objetivo, até que, lá pelas tantas, uma colega propôs usarmos um trecho do Sermão da Montanha como tema do evento.
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E o professor, que até ali estava meio quieto, respondeu de primeira. Aliás, pensou alto:
- Jesus era peripatético...
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Seguiu-se uma constrangida troca de olhares, mas, antes que o hiato pudesse ser quebrado por alguém com coragem para retrucar a afronta, dona Dirce, a secretária, interrompeu a reunião para dizer que o gerente de RH precisava falar urgentemente com o professor.
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E lá se foi ele, deixando a sala à vontade para conspirar.
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- Não sei vocês, mas eu achei esse comentário de extremo mau gosto - disse a Laura.
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- Eu nem diria de mau gosto, Laura. Eu diria ofensivo mesmo - emendou o Jorge, para acrescentar que estava chocado, no que foi amparado por um silêncio geral.
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- Talvez o professor não queira misturar religião com treinamento - ponderou o Sales, que era o mais ponderado de todos.
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- Mas eu até vejo uma razão para isso...
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- Que é isso, Sales? Que razão?
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- Bom, para mim, é óbvio que ele é ateu.
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- Não diga!
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- Digo. Quer dizer, é um direito dele. Mas daí a desrespeitar a religiosidade alheia...
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Cheios de fúria, malhamos o professor durante uns dez minutos e, quando já o estávamos sentenciando à fogueira eterna, ele retornou. Mas nem percebeu a hostilidade. Já entrou falando:
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- Então, como ia dizendo, podíamos montar várias salas separadas e colocar umas 20 pessoas em cada uma. É verdade que cada treinador teria de repetir a mesma apresentação várias vezes, mas... Por que vocês estão me olhando desse jeito?
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- Bom, falando em nome do grupo, professor, essa coisa aí de peripatético, veja bem...
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- Certo! Foi daí que me veio a idéia. Jesus se locomovia para fazer pregações, como os filósofos também faziam, ao orientar seus discípulos. Mas Jesus foi o Mestre dos Mestres, portanto a sugestão de usar o Sermão da Montanha foi muito feliz. Teríamos uma bela mensagem moral e o deslocamento físico... Mas... que cara é essa?... Peripatético quer dizer "o que ensina caminhando".
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E nós ali, encolhidos de vergonha. Bastaria um de nós ter tido a humildade de confessar que desconhecia a palavra que o resto concordaria e tudo se resolveria com uma simples ida ao dicionário.
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Isto é, para poder ensinar, antes era preciso aprender. Finalmente, aprendemos. Duas coisas:
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A primeira é: o fato de todos estarem de acordo não transforma o falso em verdadeiro.
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A segunda é: que a sabedoria tende a provocar discórdia, mas a ignorância é quase sempre unânime.
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Enquanto Jesus era peripatético a maioria dos homens são patetas!

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(Artigo escrito por Max Gehringer publicado na Revista VOCÊ SA.)
(enviado via e-mail por Amélia Faria)
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