segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O poeta e a Lua

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O Poeta e a Lua
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Em meio a um cristal de ecos
O poeta vai pela rua
Seus olhos verdes de éter
Abrem cavernas na lua.
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A lua volta de flanco
Eriçada de luxúria
O poeta, aloucado e branco
Palpa as nádegas da lua.
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Entre as esferas nitentes
Tremeluzem pelos fulvos
O poeta, de olhar dormente
Entreaberto o pente da lua.
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Em frouxos de luz e água
Palpita a ferida crua
O poeta todo se lava
De palidez e doçura.
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Ardente e desesperada
A lua vira em decúbito
A vinda lenta do espasmo
Aguça as pontas da lua.
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O poeta afaga-lhe os braços
E o ventre que se menstrua
A lua se curva em arco
Num delírio de volúpia.
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O gozo aumenta de súbito
Em frêmitos que perduram
A lua vira o outro quarto
E fica de frente, nua.
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O orgasmo desce do espaço
Desfeito em estrelas e nuvens
Nos ventos do mar perpassa
Um salso cheiro de lua
E a lua, no êxtase, cresce
Se dilata e alteia e estua
O poeta se deixa em prece
Ante a beleza da lua.
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Depois a lua adormece
E míngua e se apazigua...
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O poeta desaparece
Envolto em cantos e plumas
Enquanto a noite enlouquece
No seu claustro de ciúmes.
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(MORAES, Vinicius de. Antologia poética. São Paulo: Companhia das Letras, 1992)
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